Wednesday, December 13, 2006














Esse punhado de ossos

Esse punhado de ossos que, na areia,
alveja e estala à luz do sol a pino
moveu-se outrora, esguio e bailarino,
como se move o sangue numa veia.
Moveu-se em vão, talvez, porque o destino
lhe foi hostil e, astuto, em sua teia
bebeu-lhe o vinho e devorou-lhe à ceia
o que havia de raro e de mais fino.
Foram damas tais ossos, foram reis,
e príncipes e bispos e donzelas,
mas de todos a morte apenas fez
a tábua rasa do asco e das mazelas.
E ai, na areia anônima, eles moram.
Ninguém os escuta. Os ossos choram.

Ivan Junqueira


Wednesday, December 06, 2006

Sou...

Sou a raiva que come e deturpa a dor
Sou a chama num vazio do eterno amor
Sou a lama com que marcas as tuas pegadas
Sou a morte e a vida encruzilhadas
Sou pecado, virtude, sou perdão, sou ódio
Sou luz, água, sou ácido ascórbico
Sou as entranhas que te consomem
Sou anjo, besta, sou lobisobem
Sou eu que volto sempre ao final
Sou tu num pecado capital
Sou o nada que transparece de mim
Sou perfeito por ser assim...

Thursday, November 02, 2006

Eu não sabia explicar nós dois
Ela mais eu
Porque eu e ela
Não conhecia poemas
Nem muitas palavras belas
Mas ela foi me levando pela mão
Íamos todos os dois
Assim ao léu
Ríamos, choravamos sem razão
Hoje lembrando-me dela
Me vendo nos olhos dela
Sei que o que tinha de ser, se deu
Porque era ela
Porque era eu

Chico Buarque

...Só no silêncio reside a razão, para dar lógica aos momentos de solidão...

Tuesday, October 24, 2006





Nas ondas suspensas no ar,
voando mais alto que o alto que se pode olhar
Voo mais longe e no longínquo mar que olho,
vejo-te terra remota a pairar
Oh terra de ingratidão, oh chama de solidão,
Oh ingrata inocência amarga do perdão
Perdoo-te todos os momentos em que me fizeste chorar,
não te perdoo por te amar
Não darei condolências pelas sobras de tudo o que foste em vão,
os teus restos mortais
Serão enterrados sob a sombra do meu peito ardente,
nessa câmara penitente que ardeu
Quero ver como o jeito de um olhar
é desfeito num refeito de ar puro e respirar
Renascendo de novo ao sonhar,
com a nova terra que um dia vou conquistar
Quero partir desta pátria onde o meu coração se afogou,
Fugindo antes que me afogue na lembrança que me matou,
Quero como qualquer alguém que vive,
descobrir o amor que tive,
Ser alguém como eu sou...

Sunday, October 08, 2006


Troca-se um olhar de quimera e eis que surge porém, a vontade aguda de viver um outro dia com alguém que traz ondas de esperança a esta praia que é minha. Olho o mar... Na linha distante daquilo que traça o limite, procuro o que quero, encontro o que procuro e acabo por o perder, para querer (no fundo) descobrir que procuro em vão, algo que disforme se assemelha ao tudo que já foi meu e ao nada que nunca foi. Fará sentido que a procura seja perseverante, e, nessa linha tão remota, encontre forças na derrota, bajulando-me de insensatez, às fraquezas da minha vida...
Tudo não passa de uma tarde de outono, em que nós - árvores de folha caduca - libertamos o verão numa aguarela de tons tristes, simplesmente porque a vida é assim, porque temos necessidade de mudar, porque não faria sentido viver de uma outra forma, mesmo que de tão áspero sentimento as nossas folhas fossem sempre as mesmas, seríamos não nós, mas alguém que se assemelha aos outros, aqueles que não têm culpa...

Sunday, October 01, 2006

Ode à (in)certeza do amor

A quantas perguntas teria que responder,
Antes que o tempo te apagasse o coração,
Quantos sonhos deixaria no leito,
Quantos espinhos tiraria do peito,
Para o amor não perder em vão

A quantas torturas teria de sucumbir
Antes que a dor te matasse a permissão
Quantos trilhos andaria sem fim
Quantos labirintos criaria em mim
Para a vida não perder a razão

Pela triste melodia do adeus e ver-me ao largo a partir
Serias a vaga que me leva, seria eu o barco que espera
Mais uma maré para ir

Pela deixa de uma vida curta e um momento de escuridão,
Serias a luz da minha vida, seria eu em ti (e tu despida)
Mais uma chama de ilusão…


Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar
Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais
Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu
Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi
Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus...
Chico Buarque

Sunday, September 24, 2006

Sou mesmo é vagabundo...

Visto-me de ironias, a minha vida levou uma volta de 270º e espetei-me de lado contra a parede tentando empertigantemente passar a porta que me leva às escadas para o outro nível da vida, mas passei...
Acabei com tudo o que havia para acabar neste momento, está na hora de seguir outro azimute e descobrir o que ainda há para decobrir, e é tanta coisa, que mesmo que vivesse três vidas, não tinha tempo para ver nem metade. Mochila às costas, areia no pé e samba na areia. É a musiquinha que machuca os corações...
E a quem me pergunta, querendo saber quem sou eu? Respondo na brincadeira, ..."Sou o Rei do meu mundo, mas não é por causa disso que vou deixar de ser vagabundo"...

Thursday, September 14, 2006

Passeio por uma calçada de Lisboa, e no obséquio de querer não olhar para as pedras do chão, ergo os olhos e deparo-me comigo. A vida surge dentro de mim vinda de trás e num ápice acaba com o desejo de um futuro que se quer que seja belo, mais depressa do que o tempo passa e a solidão ( essa teimosa de sempre ) já não volta a aparecer. Estranho este sentimento de desencontro, dentro das muralhas do meu paraíso. Conceitos disparados para o ar, a vida não se rege de conceitos. Vivo intensamente tudo o que toco, sofro intensamente com tudo o que me fere, sou um mártir de mim mesmo, mas não deixo para o esquecimento as coisas que dão sabor à vida, e só conheço uma forma de amar, loucamente. Não perdoo os erros que tive de cometer, alguns que me passaram ao lado, desencontrando-me constantemente da utopia existencial. Quero, sou e aqueço a chama da paixão que tenho pela vida, e, esse ardor que se libertará numa brisa de ar fresco, irá comigo para a sepultura, um dia, velhinho quem sabe, quando todos os sonhos se acabarem, e o milagre da existência termine. Até lá viverei intensamente, amarei a vida desenfreadamente e a tudo o que me move, a todos que me fazem viver (que são o centro do meu mundo), viverei por eles, e serão sempre as pessoas mais importantes da minha vida, porque por eles sou quem eu sou. Principalmente à pessoa que dedicou o seu o seu amor e sofrimento, em acreditar num amor ferido e maltratado, que no jeito inocente de quem quer fazer as coisas bem, acabou por se perder comigo dentro de um orgulho que é só meu e sofreu ao meu lado, porque eu também sofri ao seu. Inocentemente, é ela a coisa mais linda que descobri na vida, é a soberba virtude da minha pureza, o brio e a vaidade da minha natureza, só lamento por me ter desencontrado...

"...A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida...."
Vinícius de Moraes

Monday, September 11, 2006

Errante na harmonia der ser ninguém,
Sinto o vento na minha face
Como se fosse alguém
Que me chama,
Que me desperta,
Da harmonia de uma solidão incerta,
Sinto o vulto de um olhar mais sério
Sinto o amargo sabor do mistério,
Que sou eu,
Alguém incerto,
Sou a calma chuva do deserto,
Sou a sóbria chama de uma vela,
Alguém que detesta e o mesmo tempo ama
A brisa errante que vem e retorna,
A vida, a morte e a entre elas
Sou eu,
O mundo em constante entropia,
O calor do fio da agonia,
Uma mar que se afoga e ao mesmo tempo chora,
Na triste errância da demora,
De crescer,
De ser alguém,
Sou eu, ALGUÉM!!!!!!!!!!!!!!!!!

Sunday, September 10, 2006

Deixo para dizer aquilo que não quero escrever, o vazio do nada que assombra a minha casa, transparece no nada que sai do vazio de dentro de mim, vou perdendo tempo. Uma voz ecoa no fundo do meu peito, dizendo-me que a vida está prestes a mudar, vem com o cheiro a saudade de uma maresia das ilhas gregas, sinto a brisa e o calor de um sol poente, oiço a razão que não mente, tem de ser assim... E é tão tarde! O regresso a casa é sempre triste quando, numa noite de domingo, inesperadamente me encontro sozinho, na escuridão da infelicidade que nem sempre é minha. Deixar partir alguém, seja que de forma for, é um sentimento abrupto, que desperta com uma certa intensidade a brutalidade do coração. Quem não ama não sabe perder, e quem perde alguém que ama, tem de sofrer. A vida é assim... Nunca perdi o meu tempo, apenas deixei que o tempo se perdesse em mim...


Sunday, August 20, 2006


SILÊNCIO

Pois é meu amigo, meu camarada da vida
Mais uma vez seguimos os dois
Sozinhos no cais da noite
Quando a noite passa esquecida…
A ti meu amigo, meu companheiro da sorte
Seguimos pelo mesmo trilho
Na solidão do vazio
Quando a bússola deturpa o norte
Para ti meu amigo, ao tempo que vivemos juntos
Aos versos que escrevemos e depois rasgámos
Pois só tu tens aquela força
O jeito de embalar o momento
Em ti reside a minha calma
Não fosses tu o silêncio

Monday, July 24, 2006




Alcool em virtude do desmorno,
São coisas do coração
Esquecem que são amigos,
que passam de mão em mão
Levando uma vida inutil
Está em todos dentro de nós
Estampada na outra face
É um rio que nasce na foz
A diferença marca à partida
Um rumo que não volta atrás
Amizades desta vida
Ode fenomenal erguida
Que ao morrer nos dá a paz.

Tuesday, July 18, 2006

















"...Hoje estou cruel, frenético, exigente, amo incessantemente, os ácidos, os gumes e os ângulos agudos..."

Cesário Verde (O Deambulante)

Hoje estou revoltado, enraivecido, nervoso. Para mim a lógica e a ordem não fazem sentido, embora surja sempre algo de um caminho desaparecido, escondido que componho e ponho no lugar. Sinto a brisa quente do calor escasso dos corações que deixaram de bater, sinto o fogo fátuo a subir até ao tecto num desabafo que deixo em respiração ao fumar um cigarro, e desperto pra lá de quem é realmente meu. Quem será, eu? Vejo a vida disforme e um dia que me consome como hoje alerta-me para viver, faz-me ver que nem tudo se resume a solidão, à compaixão que temos de nós próprios. A vida apaga-se num ápice e quando se quer voltar para trás desce-se velozmente a montanha que tanto custou a subir, para ter de o repetir, pelo caminho que melhor se conhece. Se isto não é deambulação, penso que é mesmo é vida de cão...
Tenho dito

Monday, June 26, 2006














As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história

da história da gente
outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida

à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma

e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto

Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida

gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou

meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade

in Chuva
Mariza

Thursday, June 22, 2006














Se a vida trouxesse no leito de quem se deita
O jeito e o peito de quem se ama
E no regaço perdido de algo que já não tem razão
Nasce a paz de viver em céu aberto, vivendo em solidão
Gritanto por algo que não pode ouvir, que corre a fugir
Arranca-se do nada e acaba-se no mesmo local
Comendo o fel que cheira mal
E fede tudo em redor.
Guarda-se a vida numa garrafa e deita-se ao mar
Esperando o desespero de alguém a encontrar
Ou de continuar a boiar, nesse mar perdido
Em que as existências não passam do mesmo sitio
Nem as circustâncias que nos deixam presos neste local
Têm o sabor dessas lágrimas de sal
Choradas pela fixação de ter de seguir sem nada
E fazer-se de novo ao mar, continuamente sem parar
Descobrir o mundo a navegar
Porque se está dentro de uma garrafa
Nesta aventura solitária…















Quando o medo nos consome
Matando o sono e a lucidez
Surge o gelo correndo nas veias
Não respondendo aos porquês
Tudo não passa de um mito
Um papão que nos assombra
Os fantasmas do passado
Voltaram de novo à ronda
Mas o que aprendi neste tempo?
A ser forte e lutar sozinho?
A criar o meu destino?
A viver cada momento?
Não. Tudo é fruto do que somos
É intrínseco a cada um de nós
Há que ser fraco e ser forte
Há que ter azar e ter sorte
E apenas escutar a voz
Esta cá dentro todos a temos
Alguns chamam-lhe a voz da razão
Eu prefiro chamar-lhe o nome
Que por vezes se cala e dorme
O coração…
















Despido num abraço, um beijo voa
Para além da loucura
Vem a paz da amargura
No regaço de quem se perde
Dentro de si próprio
Enquanto continua à procura
De algo que não se sabe bem o que é
No momento em que a liberdade acerta
E que a tristeza acarreta
A poesia da dor…

Wednesday, June 14, 2006



O TEU ROSTO

Olho e revejo o teu rosto, que me apraz
A vida num preâmbulo de querer viver
E num segundo a vida que ficou para trás
Fica presente num indefinido temporal
Nos teus olhos revejo a chama do amor
Nos teus lábios bebo da minha sede de dor
Sem conforto inerente a quem eu sou
Fico assim…
Escutando o jeito que bate dentro de mim
Procurando razão para o sentido de ser teu
Sem saber que sem sofrer posso ser feliz

(Sem o teu colo durmo no breu
Sem te sentir sou um animal
Que vira latas na rua,
e mata a fome crua
Com carcaças do lixo e deambula,
Pelo caminho da solidão
Tenho o teu rosto no coração)

SAMBA EM PRELUDIO

Eu sem você,
Não sei nem porquê,
Porque sem você,
Não sei nem chorar,
Sou chama sem luz,
Jardim sem luar,
Luar sem amor,
Amor sem se dar.

E eu sem você,
Sou só desamor,
Sou barco sem mar,
Sou campo sem flor,
Tristeza que vai,
Tristeza que vem,
Sem você, meu amor, eu não sou ninguém.

Ah, que saudade,
Que vontade de ver renascer nossa vida,
Volta querida,
Os meus braços precisam dos teus,
Teus abraços precisam dos meus.

Estou tão sozinho,
Tenho os olhos cansados de olhar para o além,
Vem ver a vida,
Sem você, meu amor, eu não sou ninguém.

Vinicius de Moraes

Tuesday, June 06, 2006




















SAUDADE

Sempre que a saudade acorda
E me vem bater à porta
Deixa as pegadas marcadas
Sobre o pó de outras dadas
Dizendo que não esta morta
Visita-me de vez em quando
Mesmo sem ser convidada
Por vezes trás companhia
A tristeza ou a alegria
Mas sempre para ser lembrada
E lembro-me muitas vezes dela
Mesmo quando ela não vem
A saudade é um princípio
Para outros será vicio
É o melhor que a vida tem…

O que conta afinal no espaço da vida
Não são as coisas em que acreditamos
São aquelas em que queremos acreditar
Nada vem por acréscimo
Se alguém quer realmente mudar
São etapas da vida, conquistas esquecidas
Que só se lembram ao conquistar
É algo que se remete do fim
Para o instante inicial
Não se vê e não se sente,
Mas sabe-se que é real…
É a utopia da vida, algo não existencial
De uma forma tão perdida
Ás cegas no caminho da vida
É a conquista final…















ONDE ESTAMOS AGORA?

Todas as miragens ao longe, se apagam de perto
Quanto o desespero se consome na quietude do deserto
A distância transfigura o que passa ao lado da solidão
Sem saber qual o rumo a seguir, qual o cais para partir
Onde estamos agora?
Pelos labirintos de franjas que seguimos
Chega o presente numa cordilheira de abismos
Na força que impulsiona e detém o que nós somos
Encontra-se sempre uma margem para saltar, ou um ramo para agarrar
Onde estamos agora?
E sempre tudo o que está longe é visto mais aquém
Quando nos confortamos no vazio e não vemos ninguém
Solta-se um grito que ecoa na margem temporal
Sente-se o dia a nascer, temos sempre uma margem para viver
Onde estamos agora?

Tuesday, May 30, 2006












Sou eu que retomo ao peso da cruz
Deslindando a ferro e fogo
O pesar do meu contentamento
Marcando cada pequeno momento
Como se fosse o último da minha vida
Sem loucura que de vão se transpareça
Ao fervor do sangue que corre dentro de mim
Obedeço ao querer de um olhar sem porquê
Olhos nos olhos para ver além do que se vê
Iluminando-me de coisas lindas
Estou em liberdade condicional...

Monday, May 29, 2006















NOITE ÉBRIA

Ébria surge a noite, neste caminho
E na sombra de quem passa,
O caminho e algo que trespassa,
No lento embalo de estar sozinho

E quem surge porém, não disfarça
A amargura de se viver sem destino
No amargo da virtude se desfaça,
A virtude de uma rota de pregrino

E doa a dor a quem sinta que o quer,
Sem pudor ou algo que transpareça
Deixa a vida transparecer na dor da tristeza

E no barco da vida jaz um jeito de graça
Que ilumina o mar e desfaz a ameaça
De alguém que se faz ao mar sem destino.

Monday, May 08, 2006













De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Morais

Thursday, May 04, 2006















Salubridade é a forma em que se define
Num contexto inerente e disforme
Em algo que transparece ao disfarce
Que nos alimenta e consome
Talvez noutro conteúdo
Encaixado em paz no vão
De se ser cego, surdo e mudo
Sem se ser dono da razão
Notas soltas sem sentido
Num trecho curto, indefinido
Assim sou eu a solidão
Murmurando bem alto
A quem eventualmente esteja a ouvir
Com esta voz de silêncio
Gestos de quem é sofrimento
Sofrendo só e sem razão.
Quantas vezes o silêncio, é tão somente o silêncio
Escutando o vazio em redor num pensamento
Quantas vezes não sabemos o caminho
E nos perdemos, sem sequer sair do lugar
Quantos amigos deixamos em cada passagem
Em cada caminho da vida…
Quando penso em alguém, só penso em ti
Não por saudade,
Mas sim necessidade
Da tua chama dentro de mim.
Sem fracassos orientados pelo sal,
Das lágrimas que deturpam a sensatez
Sou sensato e não te quero mal, vivo preso ao surreal
Que me abstrai da lucidez.
Por isso não me entrego ao desejo
Não tenho forças para mais do que vejo
Com os olhos não com a razão, nem tão pouco o coração
Apagado num beijo.
Quando alguém surge só te vejo a ti
Não serve a mais ninguém este espaço que é teu
No traço da minha aguarela, tenho o sapato da cinderela
No fundo deste baú…
E num ápice compreendo que sem ti sou mais de mim
E contigo ao meu lado também sou assim
Gosto de viver, de amar, de conhecer,
Novas formas de estar, novos rumos e lugares
Para desvendar e viver.
Mas tu és o sol sobre a lua, que sou eu
Dois pontos importantes, mas distantes
Sozinhos no limite temporal,
Que define a nossa história e lhe dá a moral,
Pois sem ti não vivo e contigo preciso
De ter espaço para aceitar,
O rumo triste de nós os dois, que se perdeu no final
De uma história de amor…

















OS TEUS SEIOS

Com a noite surge algo de novo
Nem sempre tenho sono e durmo
No espaço rejeitado da vida,
sonho contigo despida
E no teu corpo me consumo!
Nem toda a tua altivez
Esconde o pouco de timidez
Que o teu corpo ainda tem
Nos contornos desse peito,
encontro sempre o meu leito
Com a certeza porém
De me afogar na tristeza
Iludido pela beleza
De um olhar inseguro!
Deixando para trás o cansaço
Durmo no teu regaço
E vejo-me ao espelho
Observando a amargura
Que reflecte o teu receio!
E embora um pouco baço
Surge então esse traço
Da perfeição dos teus seios.
Volto a despertar
Iludido pelo olhar
E pelos meus devaneios
Gostava de não acordar
Podendo apreciar
Eternamente o que vejo
E embebedar-me no desejo
Desse teu peito invulgar…
PARA ALGUÉM

Pelos confins de nada
Faz-se de novo ao caminho
Por aqueles a quem se deve um desabafo
Para quem o futuro é baço
Por todos na nossa vida
Embala-se no céu um desejo
Que paira na penumbra do medo
A vida segue e num beijo
Voa embalada em harpejo
Outra passagem da vida
E assim o que já não torna
Torna-se deveras presente
Por aqueles a quem alguém se deu
Por todos os que vivem no breu
Para alguém que é diferente

Friday, April 21, 2006




















Rosa vem de amor,
Bela e formosa,
A mais linda flôr,
A rosa sagrada,
Um canto divino,
Uma ira apagada,
Como um violino
E uma pauta alada,
Tímida e singela,
Pérola encantada,
Brilha numa estrela,
A minha rosa amada...













!!SILÊNCIO!!

O silencio que ofusca a memória
A sombra que ainda anda a pairar
Sobre as marcas de uma guerra
No silencio de uma trégua
Nesse teu jeito de olhar
E rever a tua chama
Revivendo aquele abraço
Sufocado pelo ardor
De um coração frio e baço
Promessas de vida, planos de amor
Projectos perdidos, pelo tempo vencidos
Libertos em dor
Saudades de te ter, de te abraçar
De te ver adormecer, de poder chorar
A saudade faz a vida
Mas a solidão molda os sentidos
Na chama de um beijo eterno
Num beijo de dois amigos…
Quando uma brisa que entra, e logo liberta
O silencio vivo que me desperta
Uma voz ecoa no meio de nada
Um pouco rouca e abafada
Murmurando segredos, libertando memorias
Revivendo momentos e velhas historias
E quem sou eu para as lembrar
Se num eterno momento as estou a negar
Adormeço a ouvir, deixo a saudade partir
Este coração teimoso e sedentário
Que já não ama nem sabe amar…

Sunday, March 19, 2006





















Deixo-me levar pelo tempo,
Esqueço-me de mim,
Finjo que estou contente,
Contentando-me assim.
Mas prezo a liberdade,
Este espaço sem sentido,
Vejo os patos e as pombas,
Eles divertem-se comigo,
E não há nada que eu não goste,
Agarro-me à solidão,
Num cigarro, num café,
Nos antros do coração…
Esta vida não perdoa,
A uma azia sem sentido,
Pois esquecemos a angústia,
Conversando com um amigo,
Voltando depois ao mundo,
De alguém que nos esqueceu,
Vamos comendo o tédio,
Procurando algum remédio,
Para tentar fugir do Breu…


















Procuro um padrão
Que descreva a liberdade do coração
Escuto o que o dia me diz e me traz
Fecho os olhos, sinto no ar
O calor de um sol presente irradiando paz
Sinto-me nu perante a grandeza
De uma vida que passa diante à beleza
Fascina-me o jeito dos sentidos
A pobreza porém de não ter amigos
Pois vive-se a vida
Mesmo sem se ver
A fraqueza eminente, de querer alguém presente
E a luxúria de não querer encontrar




















MURMÚRIO

Há um murmúrio em cada gesto teu
Que me atordoa e mente
Não sei se por ironia
Ou vontade de ilusão
Estas feridas que o tempo não leva
Cicatrizam no coração
Despido em virtude desse beijo
Que não chegou a partir
As estrelas abrem arestas
Que me embalam a dormir
Juntando o céu e a lua
Numa aguarela viva
Com cheiro a maresia e sal
Pintada por poetas a dor
Desgastando a solidão a quem lhe confessa
O murmúrio do teu amor…

Ao tempo que não é eterno
Ao vento que não sopra em vão
No lamento da saudade
Encontro a verdade
Escondida no coração
Nos murmúrios que ainda oiço
Em embalos ternurentos
Que me embalam devagar
O som triste das guitarras
Chora culpas esfarrapadas
De alguém que se culpou
Na vida que transparece
Numa planta que surge e nasce
Cresce a saudade, junta com a liberdade
Nunca sem olhar para trás…
Sento-me e o tempo passa,
Simplesmente a passar,
O tempo não tem culpa,
De eu não o saber agarrar.
Se o tempo não me liberta,
Talvez no espaço possa estar,
A liberdade de expressão,
O tempo para me libertar.
Pois cada espaço é tempo,
Cada tempo é espacial,
É dicotómico como a vida,
Na tristeza e na alegria,
Dorme o tempo para sonhar…

Saturday, March 18, 2006




















JARDIM DA ESTRELA

É bom ficar calado... A ouvir.
Escutar cada brisa que passa
Cada folha a cair...
Por entre as árvores gastas,
Que o tempo não poupou,
Deixar que o vento cante,
Esperando que o tempo mande,
Promessas de uma outra cor...
E é tão bom ficar assim,
Escutando a solidão,
Ouvindo a liberdade,
Limpando o coração...